terça-feira, 21 de abril de 2009

Introdução

Muito bem, sou livre neste momento. Tenho esta oportunidade de liberdade, de realização de um portfólio na área de Enfermagem, da reflexão e expressão do que me vai na alma sem represálias. Sim, porque nos dias de hoje, de pouca tolerância e compreensão, temos de agir e falar como a maioria, senão arriscamo-nos a perder a razão (e, quiçá, o emprego!) ou a sermos considerados loucos.
Neste espaço de consideração pela minh
a pessoa (a Teresa ou Teresinha), pela minha experiência pessoal e profissional, no âmbito da unidade curricular “Dinâmica de Grupo e Desenvolvimento Pessoal”, inserida no Curso de Complemento de Formação em Enfermagem da Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, irei abordar o tema fulcral da Enfermagem, o Cuidar. Citando a conceituada teórica Jean Watson (2002): “Cuidar é a essência da Enfermagem e o foco mais central e unificador da sua prática.” Foi-nos pedido pelo professor docente, António Nabais, que o trabalho final fosse uma construção para além de um trabalho escrito, com maior suporte das inovações da informática. Assim, construi este blogue para expressar as ideias que construí ao longo da vida e divulgá-las não só a alguém da área profissional com abertura mental e emocional suficientes para me compreender (ou, no mínimo, tentar compreender), mas também a um público mais alargado.
Irei então, de uma forma autêntica, “abrir” o que sou e permitir revelar as minhas reflexões sobre a matéria do Cuidar que é implícita à Teresa (pessoa e profissional). De uma forma simples, séria, clara, objectiva e inter-relacionando-a com as nossas aulas da unidade curricular, iniciarei esta minha reflexão com a definição do Cuidar, relacionando-a de seguida com outros conceitos implícitos: Vida, Humanidade, Saúde. Reflectirei sobre o Cuidar e Descuidar, sobre a importância da comunicação e da relação de ajuda no contexto profissional, sobre a importância de cuidarmos de nós próprios e, finalmente, farei uma reflexão em que tentarei, humildemente, partilhar convosco algumas sugestões sobre como o Cuidar deveria ser.
Não quero nem posso desperdiçar esta oportunidade! Está, desde já, a ser um imenso prazer e ganho a construção deste texto. A minha aposta é feita, então, tanto no conteúdo escrito como na expressão, bem como num processo interactivo em que o próprio leitor possa participar. Quem sabe, tocar no coração de algum ser humano. Agradeço aos meus colegas, pela partilha e confiança, e ao professor, por ter cuidado tão bem de nós e, em particular, ter-me dado a coragem para partilhar e gritar o que sinto.

Definição de Cuidar

“Nós existimos em cuidado” Honoré

O que significa “Cuidar”? Para mim o significado deste conceito pode ser inteiramente ou parcialmente diferente do significado que o meu vizinho, que trabalha num banco, lhe poderá atribuir. Cuidar: para o padeiro, para o jurista, para o físico, para o médico, sociólogo, etc., que definições terá? Citando Hesbeen (2004):

“Para o filósofo, ‘cuidar’ significa procurar a sabedoria e a verdade; para o antropólogo significa observar o homem, bem como as instituições e as próprias técnicas nas diferentes sociedades, a fim de estabelecer os elos de significação; para o juiz significa encarnar a justiça; para o político significa cuidar da cidade; para o médico significa curar; para o homem de negócios significa produzir lucros; para o agricultor significa cultivar a terra e alimentar os homens; para o artesão e para os pedreiros significa fabricar objectos aptos a melhorar a vida.”


Todos estes indivíduos são, antes de tudo, pessoas que exercem uma profissão, profissão essa que “cuida” de todos nós. Se realizarmos de forma competente e humana cada uma das nossas profissões, estaremos a Cuidar da nossa sociedade. Antes de sermos profissionais somos pessoas e, como tal, cuidamos como pais, filhos, irmãos, amigos, etc. Antes de ser enfermeira, sou filha, irmã, colega, amiga, prima, tia, sobrinha, vizinha – e, ao desempenhar cada um destes papéis sociais, cuido daqueles que me rodeiam. Em suma: o Cuidar diz respeito a cada um de nós. A humanidade, para existir e se perpetuar, necessita de Cuidados. 

Concretamente, na minha área profissional este conceito pode ser definido das seguintes formas:

“Cuidar é, e será sempre indispensável, não apenas à vida dos indivíduos mas à perenidade de todo o grupo social. Esta função primordial, inerente à sobrevivência de todo o ser vivo, foi profundamente alterada entre os humanos à medida das grandes mutações tecnológicas, socioeconómicas e culturais que geram a explosão e a dissecação das práticas de cuidados numa imensidão de tarefas e actividades diversas, disputadas tanto por profissões como por ofícios.” Collière (1989)

“Cuidar significa dar especial atenção a uma pessoa que vive uma situação específica e isto na perspectiva de lhe prestar ajuda, de contribuir para o seu bem-estar, para a sua saúde.” Élisabeth Darras et al (2004) citando Hesbeen (1997)

“(…) os cuidados de Enfermagem são assim, compostos de múltiplas acções que são sobretudo, apesar do lugar tomado pelos gestos técnicos, uma imensidão de ‘pequenas coisas’ que dão a possibilidade de manifestar uma ‘grande atenção’ ao beneficiário de cuidados e aos seus familiares, ao longo das vinte e quatro horas do dia.(…) essas ‘pequenas coisas’ não se devem confundir com ‘pequenos actos’ (…) trata-se, isso sim, de todas essas ‘pequenas coisas’ da vida, aquelas que, para uma determinada pessoa, dão sentido à vida e são importantes.” Hesbeen (2000)

“Os cuidados de Enfermagem são a atenção particular prestada por um enfermeiro a uma pessoa e aos seus familiares – ou a um grupo de pessoas – com vista a ajudá-los na sua situação, utilizando, para concretizar essa ajuda, as competências e as qualidades que fazem deles profissionais de Enfermagem. Os cuidados de Enfermagem inscrevem-se assim numa acção interpessoal (…) consiste tanto em colocar uma perfusão como um proceder aos cuidados de higiene; em fazer um penso como em ajudar alguém a ir à casa de banho; em reconfortar familiares como em explicar a organização da hospitalização; em preparar a alta como em sentar-se à beira da cama para falar ou para ficar calado, para sorrir ou para tocar, ou muito simplesmente para estar ali; em preocupar-se com o autoclismo que verte como em explicar como executar certos cuidados a si próprio; em medir os sinais vitais como em jogar às cartas ou regular a televisão.” Hesbeen (2000)

“(…) os cuidados de enfermagem propõem-se participar activamente em tudo o que contribua para desenvolver o potencial de vida da pessoa inserida na sua rede familiar e social; tentar utilizar ao máximo tudo o que resta desse potencial de vida, quando se vê afectada ou diminuída pela doença ou por uma deficiência, seja qual for a variedade das origens e das formas que estes últimos possam revestir. (…) importa aqui procurar tudo o que possa ser desenvolvido, suscitar e estimular o desenvolvimento das capacidades físicas, mentais e sociais para fortalecer o que existe ou o que resta de autonomia, discernir o que deve ser compensado, estimular e libertar as capacidades potenciais. (…) o conjunto de um processo de discernimento de necessidades de saúde indispensáveis à vida de alguém ou de um grupo; ou seja, uma interrogação, um diagnóstico, relativos às necessidades vitais, sejam de ordem biológica, afectiva, social e económica, assim como das inter-relações e das influências que se estabelecem entre elas; E a acção que se deve executar para lhe dar resposta. Esta acção pode-se realizar com outras pessoas, sejam profissionais ou não. ” Collière (2001)

“O cuidado como maneira atenta de tomar conta de alguém ou de qualquer coisa com vista à sua salvaguarda, ou seja, à sua manutenção sã e salva naquilo que ele é, com todas as suas qualidades e faculdades caso se trate de uma pessoa.” Honoré (2004)

“O cuidado é, então, característica da nossa existência. Revela-nos o sentido de uma vida possível, num projecto de vida. O sentimento fundamental neste cuidar, é a alegria que advém do prazer de viver, a partir do momento em que é reflectido e independente de qualquer objecto particular de forma a conduzir ao desenvolvimento de uma existência que se cumpre. A alegria presente no cuidar sem imposições materiais, transcende tanto o prazer como o sofrimento.” Élisabeth Darras et al (2004)


Carl Rogers (1971) diz que é a qualidade do encontro com o utente que constitui o factor determinante da eficácia dos cuidados. No mesmo sentido, Evelin Adam (1994) considera que os cuidados de Enfermagem deviam ser sempre prestados no quadro de uma relação de ajuda.

Através da minha pesquisa bibliográfica concluo que o cuidar em Enfermagem é fulcral e essencial. Enfermagem é cuidar do outro, um cuidar que tem em consideração o ser humano na sua totalidade bio-psico-socio-emocional. Inscreve-se numa relação interpessoal de ajuda e visa um desenvolvimento do potencial de vida da pessoa inserida na sua rede familiar. É, muitas vezes, dificilmente mensurável e frequentemente não é reconhecido pela sociedade e, noutras ocasiões, nem pelos próprios enfermeiros, que ainda acham que a essência do cuidar reside nos cuidados bio-médicos.

Cuidar: Vida, Saúde, Humanidade

Não se pode falar em Cuidar sem se falar sobre Vida, Saúde e Humanidade. Os conceitos encontram-se interligados num processo dinâmico.

“Qualquer actividade humana, em tudo o que tem efeito sobre os outros e sobre o ambiente, coloca um problema de salvaguarda daquilo que torna possível a nossa existência. Salvaguarda da vida, não apenas nos seus aspectos biológicos, mas também nos seus aspectos existenciais, isto é, salvaguarda da dignidade humana. O cuidado é uma dimensão fundamental do agir humano, no dinamismo de uma energia onde ele reconhece aquilo a que se chama saúde.” Honoré (2004)

“Saúde e vida estão intimamente ligadas, no sentido em que a saúde representa o conjunto das possibilidades que permitem à vida manter-se e desenvolver-se.” Collière (2001)

Ora, falamos em Cuidar para haver Saúde e Vida. A Saúde como definição ou como conceito é de aparição muito recente. SALUT traduz-se em verbo de acção por “eu te saúdo; eu reconheço-te em vida; eu reconheço que tu vives; eu reconheço o que vive em ti.” Numa visão universal da saúde enquanto conceito aplicável a todos os seres vivos, Capra (1983) menciona:

“Para estar são, um organismo deve preservar a sua autonomia individual e simultaneamente ser capaz de se integrar de um modo harmonioso em sistemas mais vastos (…). Esta capacidade de integração está directamente ligada à flexibilidade do organismo e ao conceito de equilíbrio dinâmico.”

Greenberg (1989), numa visão holística, descreve a saúde como uma qualidade de vida que se caracteriza sob o plano:
- da saúde social, pela capacidade de interagir com os outros e com o seu ambiente e de ter relações interpessoais satisfatórias;
- da saúde mental, pela capacidade de aprender e desenvolver as suas capacidades intelectuais;
- da saúde emocional, pela capacidade de dominar as suas emoções de modo a expressá-las no momento oportuno e de forma ajustada;
- da saúde espiritual, pela crença numa força unificadora (a natureza, as leis científicas, a força divina, etc.);
- da saúde física, pela capacidade de realizar as tarefas quotidianas sem sentir um cansaço excessivo e conservando a sua integridade biológica.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde, que tem como objectivo o máximo desenvolvimento possível do nível de saúde de todos os povos, a saúde é “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente a ausência de uma doença ou enfermidade.” No entanto, as pessoas costumam dizer que estão doentes quando a manifestação física já se encontra instalada. Sabemos que toda a manifestação de alguma doença é causada por uma multiplicidade de factores e não por um único factor, tendo em consideração o sistema complexo que é o ser humano. Citando Ogden ( 1999):

“A Psicologia da Saúde tenta afastar-se de um simples modelo linear de saúde e sustenta que a doença pode ter origem numa combinação de factores biológicos (por exemplo, um vírus), psicológicos (por exemplo, comportamentos, crenças) e sociais (por exemplo, emprego). Esta abordagem reflecte o modelo biopsicossocial de saúde e doença, que foi desenvolvido por Engel.”

Sensações de mau-estar como o sofrimento, o desespero, o desânimo, o stress, quando vivenciados de forma prolongada, influenciam o estado de saúde. Inclusivamente há estudos científicos que o comprovam, demonstrando a relação entre o stress “crónico” e o surgimento de cancro, por exemplo.

Para mim, bem-estar também significa um desenvolvimento profundo das nossas capacidades e potencialidades como seres humanos, esses seres extraordinários. O escritor e poeta russo Boris Pasternak escreve em “Doutor Jivago” (1957): “A grande maioria é obrigada a viver uma vida de duplicidade constante e sistemática. A saúde tem de ser afectada quando, dia após dia, se diz o contrário do que se sente, se rasteja diante do que se detesta e se rejubila com o que nada traz senão azar.”
Muitas vezes chego à conclusão de que o ser humano, para viver como ser social e sentir-se amado e integrado pelos pares, não tem a coragem de assumir o que é, não vive em bem estar por não se dar ao cuidado de observar e desenvolver as suas capacidades e potencialidades inatas e únicas. Perdemos a nossa identidade quando cedemos às exigências dos outros ou nos tornamos algo que os outros querem que sejamos para obter a sua atenção ou o seu amor.
Cada um de nós é único e especial e, ao desenvolver as suas potencialidades ao máximo, as consequências serão: alegria, sensação de realização, de sentido, de um real preenchimento, numa aproximação à plenitude do bem-estar.

Comunicação e relação de ajuda no contexto profissional

Somos comunicação! É-nos impossível viver sem comunicar! Mesmo quando temos uma atitude evasiva para não comunicarmos, todo esse comportamento em si é comunicação! Também é impossível vivermos sem uma relação de cuidar. Vida implica Cuidados, logo, Saúde implica Cuidados.
Durante as aulas de “Dinâmica de Grupo e Desenvolvimento Pessoal”, senti-me estimulada a reflectir sobre a relação que se estabelece entre as pessoas, a relação de cuidado que eu crio com as pessoas. Lembro-me de uma das nossas actividades de grupo, em que tínhamos de, sem comunicar verbalmente, ajudar o colega que estava a realizar uma actividade que não sabíamos de antemão qual era, já que havíamos permanecido fora da sala. Então, quando entrei na sala, deparei-me com a colega imóvel, a dirigir o olhar ligeiramente para baixo, sentada numa cadeira. Nos primeiros instantes senti-me impotente e questionei-me sobre que tipo de ajuda precisaria. Seguidamente tentei colocar-me no seu Lugar, no seu pensamento, e imaginar uma série de hipóteses. Ajoelhei-me a seus pés, tentando ir ao encontro dos seus olhos. Nada percebi… Toquei na sua mão com a esperança de ter algum feedback…
Com este exercício, cheguei à conclusão de que Cuidar implica uma relação de ajuda profissional baseada na comunicação. Citando Chalifour (2008):

“Num contexto profissional, a relação de ajuda consiste numa interacção particular entre duas pessoas, o interveniente e o cliente, cada uma contribuindo pessoalmente para a procura e a satisfação de uma necessidade de ajuda. Para tal o interveniente adopta um modo de estar e de fazer, e comunica-o de forma verbal e não verbal em função dos objectivos a alcançar. Os objectivos estão ligados ao pedido do cliente e à compreensão que o profissional tem dessa dificuldade.”

Ainda Chalifour:

“Assegurando-se em criar condições relacionais excelentes, o interveniente visa diversos fins, que podemos resumir do seguinte modo:
- favorecer a presença de um contacto físico (pelos sentidos) e de um contacto afectivo;
- assegurar que o cliente se sente compreendido e entendido;
- assegurar(se) que o serviço oferecido é personalizado e responde às expectativas do cliente;
- estabelecer um clima de confiança, de calor e de respeito;
- favorecer uma participação optimizada do cliente;
- fazer desta experiência relacional uma ocasião de aprendizagem e desenvolvimento para o cliente;
- utilizar de um modo adaptado a experiência relacional por forma que esta contribua para os efeitos terapêuticos pretendidos;
- em certas ocasiões servir de meio psicoterapêutico privilegiado, para melhor compreender relações traumáticas passadas ou mesmo, para as ‘reparar’ (…) ilustra o movimento psíquico observável ao longo de uma relação de ajuda profissional:
Estou interessado por ti.
Estou disponível para ti.
Confio em mim e confio em ti.
Tenho a coragem de olhar quem sou e o que vivo em relação a ti.
Aceito o risco de o partilhar contigo.
Reconheço-te diferente de mim.
Reajo aos teus modos de ser diferente.
Aproximo-me de ti e percebo melhor as nossas diferenças.
Deixo-te pleno de energia e aberto a outras experiências.”

É importante que o cliente se envolva e participe nas decisões que lhe dizem respeito. É importante que comunique connosco. É ele o principal responsável pela sua saúde e pode querer, ou não, ser ajudado.
Como escreve Riley (2004): “Quando uma pessoa é amável, ajuda, é sincera, aberta, afeiçoada e calorosa, torna-se num agente terapêutico, por pequeno que seja”.

Cuidar dos outros e de nós próprios

Numa das primeiras aulas da unidade curricular, o professor António Nabais convidou-nos a saltar individualmente de cima da lareira da sala de aula em direcção aos braços entrelaçados de cerca de dez colegas. Fi-lo! Com medo, mas fi-lo! Gritei inclusivamente!
Tenho medos internos,
como cada um de nós. Tenho medo da solidão, medo de perder as pessoas que amo, medo de não ser capaz, de ser má enfermeira. É curioso que o meu maior medo seja de mim mesma: sinto que sou ilimitada, que vou buscar forças não sei onde nos momentos difíceis, que posso ser muito “boa” mas também o pior dos seres humanos. Dentro de mim reúnem-se capacidades que nem eu mesma conheço. Muitas vezes penso que as características menos “boas” que existem dentro de cada um de nós, se bem canalizadas, podem contribuir para um resultado positivo como, por exemplo, a canalização da raiva ou ira em defesa dos direitos humanos. Sou muito insegura; tenho pouca confiança e auto-estima. Talvez porque, por uma questão cultural (sou natural do Alentejo), sempre realçaram as minhas características menos agradáveis e até me comparavam com outros “meninos” “melhores” do que eu. Numa das aulas senti imenso desejo de participar num dos “role-playings”, mas o medo e a insegurança apoderaram-se de mim… Parece que tenho de ser “perfeita” para que os outros me amem e aceitem. Senti medo de falhar, de bloquear. Por acaso, há muito que penso em utilizar o psicodrama para me auxiliar na conquista de uma maior confiança.
Chalifour (2002) fala-nos da importância do auto-conhecimento para uma melhor utilização dos recursos pessoais, propondo três tipos de exercícios (todos eles praticados na sala de aula com o professor):

Primeiro tipo de exercícios: centração através da respiração e através de imagens mentais. Este tipo de exercícios, onde calmamente a pessoa ‘viaja’ através do ar que entra nos seus pulmões ou através de uma imagem mental que percorre o seu corpo, permite entrar em contacto com centros energéticos e utilizá-los de forma mais judiciosa e harmoniosa. A sua prática contínua permite obter níveis cada vez maiores de performance na realização e na capacidade de estar atento a si mesmo e ao seu ambiente.

Segundo tipo de exercícios: reflexão. Faz-se um balanço sobre o desenvolvimento pessoal e profissional; os desconfortos, insatisfações quotidianas em casa e no trabalho; a resposta às necessidades fundamentais; a descoberta de si – através de registos escritos. Faz-se ainda uma reflexão, através de exercícios de respiração, de uma maior consciência de si.

Terceiro tipo de exercícios: meditação. Visa, através da concentração no mínimo de pensamentos possível, criar uma espécie de ‘local interior’ para momentaneamente esquecer o seu ser físico e aceder ao seu ‘ser superior’.


A capacidade de introspecção permite reconhecer os nossos próprios estados afectivos, aceitá-los e geri-los de forma equilibrada. Torna-nos também abertos às emoções dos outros para as reconhecer e aceitar. O enfermeiro que é sensível aos seus próprios sentimentos pode sê-lo também em relação aos da pessoa cuidada, o que lhe permite manifestar empatia e proceder de maneira a que ela se sinta compreendida e, segundo Jean Watson (2002), “capaz de ir em direcção a um nível superior de funcionamento e de crescimento”. Este factor é tão importante para a autora que, sem ele, “os cuidados de enfermagem não existiriam”.
Ao reflectirmos sobre os nossos comportamentos como pessoas e profissionais que visam, no fundo, um sentimento de realização e de bem-estar, tornamo-nos mais conscientes do que somos, das nossas inúmeras e infindáveis capacidades, melhoramos exponencialmente a nossa capacidade de relação interpessoal e consequentemente tornamo-nos cuidadores mais eficazes.

Será que cuidamos? Ou antes descuidamos?

Será que cuidamos? Ou antes descuidamos? Será que nós, enquanto indivíduos e enquanto enfermeiros, aplicamos o que foi até aqui abordado? E a generalidade do Ser Humano, será que cuida e tem promovido o Cuidar? Será que é e tem sido fomentado esse profundo desenvolvimento que nos traz a sensação de saúde e bem-estar pleno que mencionei anteriormente? Deixo-vos com alguns vídeos para vos ajudar a reflectir.

O Fim do Mundo em 60 Segundos

Pense Antes de Sujar o Ambiente

A Criança que Calou o Mundo por 5 Minutos

Estatuto da Criança e do Adolescente

Criança vê, criança faz. Dê o Exemplo!

Sometimes it takes more than medication

Todos sabemos que o mundo é comandado pela força do dinheiro. Falando do meu caso particular, durante a minha adolescência quase enveredei por caminhos muito pouco saudáveis! Vivia em Beja, os meus pais não eram propriamente ‘abastados’ e eu, sentido um grande desejo de aprender as artes como a representação, a música, o canto, etc., tive de optar por outras vias mais económicas: inseri-me num grupo religioso onde passava horas com jovens enérgicos, como eu, a fazer todo o tipo de actividades recreativas e culturais gratuitamente.
Num contexto mais alargado, seria talvez dispendioso demais para o Estado assegurar actividades culturais – como, por exemplo, visitas de estudo em grupo para os jovens e idosos – que favoreçam o crescimento pessoal dos cidadãos e o sentido de pertença a um grupo, bem como a promoção de estilos de vida saudáveis.
Os cuidados de saúde Primários, que deveriam ser alvo de franco investimento, são, como na maioria das situações, descurados. A própria Saúde é um negócio, sendo que a soma das receitas cobradas deve ser igual ou superior aos custos dos cuidados prestados. Existem interesses económicos e políticos de mercado (por exemplo, o mercado farmacêutico) e de organismos de sustentação financeira (como a Segurança Social, por exemplo). Como se pode ler na edição de Janeiro de 2009 do Jornal “Saúde”:

“Foi na saúde que os grandes grupos financeiros vislumbraram a mais importante área de negócio a explorar. Mas para tanto torna-se necessário retirar ao estado a parte rendível do Serviço Nacional de Saúde, tudo o que der dinheiro fácil, em particular tudo o que o estado se vê obrigado a pagar. Trata-se no fundo de um modo subtil de passar para os privados o dinheiro dos contribuintes, de todos nós. (…) Os medicamentos voltam a estar na berra. Cada vez mais caros e menos comparticipados.”

A saúde é entendida cada vez mais como um artigo de consumo que se pode comprar; entrou na lógica do mercado livre. Os medicamentos são objecto de um marketing desenfreado, como qualquer outro objecto de consumo. A forma de tratar da nossa sociedade é um processo em que os problemas não-médicos são tratados como médicos, havendo a “necessidade” de prescrição de medicamentos (consumismo). Os médicos e a indústria recompensam-se mutuamente pelas razões erradas, gerando um ciclo vicioso: “a indústria farmacêutica é a mais rentável de todas as indústrias lícitas, mais que a Banca, as telecomunicações e a informática.”
Todos conhecemos a corrupção que caracteriza as indústrias biotecnológica e farmacêutica: o uso de pessoas carenciadas como cobaias em ensaios clínicos (práticas sem ética) para desenvolver novos medicamentos nega as necessidades de saúde ao Terceiro Mundo.

Segundo Susan Wright (2001):

“Embora apoiando a Convenção sobre Armas Biológicas, o presidente Clinton sucumbiu às pressões das indústrias biotecnológicas e farmacêuticas. Em resumo, somente uma fracção das instalações de defesa biológica norte-americanas podia ser inspeccionada.”

Apenas 0,2% da investigação farmacêutica se dedica a doenças responsáveis por 25% das mortes no mundo. Apenas 1% dos medicamentos comercializados se dirige ao tratamento das doenças dos países em vias de desenvolvimento, porque a investigação destes fármacos não é economicamente rentável. A indústria farmacêutica dedica a recursos de marketing o dobro do que dedica à investigação e desenvolvimento.

Questiono-me se isto será Cuidar…

Talvez seja possível um melhor Cuidar

Os dias prósperos não vêm por acaso. Nascem de muita fadiga e muitos intervalos de desalento.Camilo Castelo Branco


Talvez…

… se se planeasse a Educação com base no respeito pela Natureza e pelos outros…

… se se investisse mais nos Cuidados de Saúde Primários e na prevenção (em vez do tardio ‘remédio’ para situações que, muitas vezes, já se tornaram irremediáveis)…

… se se pusesse um ponto final à corrupção das indústrias biotecnológicas, farmacêuticas e de investigação…

… se se pensasse no bem-estar e no desenvolvimento do potencial humano em primeiro lugar e nos lucros económicos em quarto ou quinto lugares…

… fosse possível um melhor cuidar…


Concordo com as premissas da Declaração de Alma-Ata (1978):

“Os Cuidados de Saúde Primários reflectem, e a partir deles evoluem, as condições económicas e as características sócio-culturais e políticas do país e suas comunidades, e baseiam-se na aplicação de resultados relevantes de pesquisa social, biomédica e de serviços da saúde, e da experiência em saúde pública. (…) Têm em vista os problemas de saúde da comunidade, proporcionando serviços de promoção, prevenção, cura e reabilitação, conforme as necessidades. (…) Envolvem, além do sector da saúde, todos os sectores e aspectos relacionados com o desenvolvimento nacional e comunitário, mormente a agricultura, a pecuária, a produção de alimentos, a indústria, a habitação, as obras públicas, as comunicações e outros sectores, e requerem os esforços coordenados de todos os sectores. (…) Requerem e promovem a autoconfiança e a participação comunitária e individual no planeamento, organização, funcionamento e gestão dos cuidados de saúde primários, fazendo o mais pleno uso dos recursos disponíveis, locais, nacionais e outros, e, para esse fim, desenvolvem, através da educação apropriada, a capacidade de participação das comunidades.”

“Todos os governos devem formular políticas, estratégias e planos nacionais de acção, para lançar e sustentar os cuidados de saúde primários em coordenação com outros sectores. Para esse fim, será necessário agir com vontade política, mobilizar os recursos do país e utilizar racionalmente os recursos externos disponíveis.”


Tenho consciência de que ainda estamos muito longe de viver num mundo em que os princípios que acabo de transcrever sejam efectivamente aplicados. É necessário, antes de mais, proceder a uma total mudança de mentalidades. Mas, a meu ver, esta mudança não deve ser simplesmente deixada a cargo dos governantes. Talvez tenha de ter início em Nós, em cada um de nós, com coisas simples – como o nosso cuidar de Enfermagem. Coisas simples e essenciais, que fazem toda a diferença.

“A capacidade de conseguirmos desenvolver gradualmente e de nos colocarmos na posição do doente, faz com que consideremos que são as pequenas coisas e as coisas mais simples é que constituem os cuidados de Enfermagem.” Monforte (2006)

“Quando se atingem os limites de intervenção dos outros prestadores de cuidados, as enfermeiras e os enfermeiros terão sempre a possibilidade de fazer mais alguma coisa por alguém, de o ajudar, de contribuir para o seu bem-estar, para a sua serenidade, mesmo nas situações mais desesperadas”. Hesbeen (2000)


No meu dia-a-dia, esforço-me por respeitar o ambiente, por exemplo, fazendo a selecção do lixo e poupando ao máximo energia e água. Nunca deito lixo no chão e incuto esse hábito nos outros. Relaciono-me com todos com o máximo de respeito, independentemente das suas profissões, títulos, cor da pele, religiões e filosofias de vida. Fico inclusivamente muito transtornada e chamo à atenção quando outros usam a sua “autoridade” para destratar aqueles que consideram inferiores. Acredito que somos todos iguais, importantes e extraordinários. Cada um, com as suas características únicas, contribui para um mundo mais rico. Esforço-me para ser uma boa cuidadora (boa amiga, filha, irmã, tia, sobrinha, prima, enfermeira, colega), tentando ser tolerante com os meus defeitos e os dos outros e, muitas vezes, perdoando a mim própria e aos outros as “falhas” que todos temos.


Como disse Albert Einstein:

"Não pretendemos que as coisas mudem, se sempre fazemos o mesmo. A crise é a melhor bênção que pode ocorrer com as pessoas e países, porque a crise traz progressos. A criatividade nasce da angústia, como o dia nasce da noite escura. É na crise que nascem as invenções, os descobrimentos e as grandes estratégias. Quem supera a crise, supera a si mesmo sem ficar ‘superado’. Quem atribui à crise seus fracassos e penúrias, violenta seu próprio talento e respeita mais aos problemas do que às soluções. A verdadeira crise é a crise da incompetência. O inconveniente das pessoas e dos países é a esperança de encontrar as saídas e soluções fáceis. Sem crise não há desafios; sem desafios a vida é uma rotina, uma lenta agonia. Sem crise não há mérito. É na crise que se aflora o melhor de cada um. Falar de crise é promovê-la, e calar-se sobre ela é exaltar o conformismo. Em vez disso, trabalhemos duro. Acabemos de uma vez com a única crise ameaçadora, que é a tragédia de não querer lutar para superá-la."


Gostaria de lutar por um mundo melhor, de não me permitir acomodar nem “fechar os olhos”. De não ficar adormecida dentro do meu grande potencial, de gritar o meu Ser, como fazíamos nas  estimulantes e divertidas aulas de “Dinâmica de Grupo e Desenvolvimento Pessoal”. O nosso grupo já não existe, mas eu quero continuar o Grito de Grupo, o Grito de Libertação de todos os seres, o Grito da Humanidade! O Grito do Desenvolvimento Pessoal de cada um, dentro das dinâmicas e vicissitudes do extenso Grupo Humano.